Flavio Cruz

O violão

Não sei por que o Beto me colocou ali, desajeitado, em cima de uma caixa no banco de trás do carro. Ele é distraído, eu sei. Mas precisava deixar o vidro aberto? Ele sabe que eu não posso fazer nada e não é só por que tenho um só braço. É mais complicado do que isso, você vai ver.
O Beto gosta muito de música. Entretanto, não tenho tanta certeza se ele gosta da vida. Estou dizendo isso por causa do jeito que ele dirige. Hoje, por exemplo, não tem nada para fazer, e mesmo assim, está correndo como louco por essas ruas. Faz curva fechada, nem diminui a velocidade. Qualquer hora...
Eu não falei? Eu fui atirado para fora do carro na última esquina. Ele nem percebeu, continuou acelerado. Não foi nada fácil, aterrizar, assim, direto no asfalto. Tenho certeza de que alguma coisa está quebrada. Eu não posso me mexer e este monte de carro, passando, tentando se desviar de mim... Ai, esse me pegou, pegou meu braço. Agora sei que não vou tocar mais. A não ser que me “consertem”, mas vai ser uma reforma e tanto, não sei se vale a pena. Justo agora que o Beto e eu estávamos acertando bem as notas. O samba já estava saindo bem há muito tempo. Ultimamente estávamos tentando o chorinho e não é que estava dando certo? Agora, não vai ter nem choro nem vela, com minha mão massacrada e este meu único braço inútil. Será que agora, pelo menos, o Beto se deu conta de que eu caí do carro? Também não adianta mais... Começou a chover. Agora sim é que as coisas vão piorar. Não vai ter mais jeito.
Espera aí, vem vindo um mendigo aí. Não vai adiantar muito, pois tenho certeza de que ele não sabe música. Mas quem sabe ele me pega e me leva para alguém, que me conserte, quem sabe? Ele me olha, balança a cabeça e vai embora. Nem ele se interessou. Devo estar mesmo todo quebrado.
É definitivo. Minha carreira de violão, acho que terminou. As cordas estão soltas, minha madeira já está até inchada de tanta água. Nem milagre... Será que pelo menos o Beto vai sentir falta de mim, seu violão, quando chegar em casa?
Se ele fosse compositor, poderia, ao menos, fazer um samba para mim. “Onde está meu violão, coitado está na solidão, perdido na noite escura, na rua da amargura”. Não está bom, só tem rima, não tem emoção. O Beto não sabe compor mesmo, ele não ia fazer nada. Mas acho que triste ele vai ficar... “Quem canta comigo, canta o meu refrão, meu melhor amigo é meu violão.” Seria bonito se o Beto cantasse igual ao Chico. Mas não sei não, esse Beto é muito distraído...

Todos los derechos pertenecen a su autor. Ha sido publicado en e-Stories.org a solicitud de Flavio Cruz.
Publicado en e-Stories.org el 02.04.2015.

 
 

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